
A FALÊNCIA do planeamento

Gostava de ter como parte central da minha campanha o planeamento urbano e o ordenamento do território. Sei que não é sedutor, do ponto de vista eleitoral. Mas é, provavelmente, o que as nossas cidades mais precisam. E, nem de propósito, há duas
semanas assistimos a mais uma decisão incompreensível que põe em causa o futuro de uma área muito sensível de Cascais.
A Câmara Municipal de Cascais decidiu, com a ligeireza do costume, oferecer 200.000 m² de terrenos públicos à Universidade Nova de Lisboa e ainda somar um apoio financeiro substancial.
Tudo isto para um polo universitário construído à volta do aeródromo de Tires, uma espécie de hub académico com vista para jatos privados.
Para quem acompanha o município, o enredo não surpreende. O que surpreende é a falta de memória. É que foi esta mesma Câmara, com sucessivas maiorias absolutas da AD desde 2001, que em 2019 aprovou os Termos de Referência para uma ampla operação urbanística naquela zona. Prometeram estudos de impacto ambiental, um plano de urbanização sério, habitação e uma escola. Até agora, nada.
Cinco anos depois, nem plano, nem estudos, nem explicações. Em vez disso, há decisões tomadas à pressa, sem base técnica, num território onde vivem milhares de pessoas que já lidam com o aumento do ruído, fruto da transferência de tráfego aéreo da Portela para Tires. A opção política foi clara: improvisar.
Mas esta não é uma exceção. É uma regra.
Basta olhar para o Plano Diretor Municipal de Cascais, revisto em 2015. A legislação é clara: o PDM deve ser reavaliado até dez anos após a sua entrada em vigor. Estamos em 2025. A Câmara não apresentou qualquer ponto de situação. Nenhum relatório do Estado do Ordenamento do Território (REOT), que deveria ser feito de quatro em quatro anos. O último? Não há.
Não se conhecem os estudos base, nem ambientais, nem de tráfego, nem de ruído, nem de equipamentos. O que devia ser o ponto de partida para qualquer revisão do planeamento continua por fazer. E, no entanto, a construção avança.
Três mandatos depois, o presidente da Câmara tem tempo para publicar dezenas de balanços nas redes sociais: da cultura ao desporto, da inovação aos prémios recebidos. Mas sobre planeamento territorial, reabilitação urbana, reforço da rede viária ou gestão urbanística? Silêncio absoluto.
E quando se fala em prioridades, há um número que diz tudo: desde que Carlos Carreiras foi eleito presidente em 2013, a Câmara Municipal de Cascais não concluiu um único novo edifício de habitação pública a custos controlados. Nem um. Nem com o PRR disponível. Nem com os preços da habitação a expulsarem famílias do concelho.
Planeamento exige método. Exige visão, exige continuidade. Cascais teve décadas de poder absoluto para o fazer e falhou. Não por falta de recursos, mas por falta de vontade.
Cascais precisa de outra coisa. Precisa de quem saiba que urbanismo não é um favor que se faz a investidores. É um compromisso com quem cá vive!
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1 Comment
EXCELENTE observação e promessa de mudança. Só tenho pena de não ser cascaense para apoiar mais este candidato independente.