QUANDO os grandes da bola vinham ao campo do Dramático (e até perdiam…)

Este é um apontamento sobre os ídolos e as glórias do Grupo Dramático e Sportivo de Cascais.

Há poucas semanas, desloquei-me a Lisboa e subi o Chiado, passando por uma Feira de Antiguidades que se realiza há vários anos na Rua Anchieta. Foi aí, numa das bancas, que se me deparou esta gravura antiga representando um jogador de futebol cujo equipamento imediatamente reconheci como sendo o do nosso Dramático.

Trata-se de uma litografia de uma colecção editada há perto de 100 anos pela Associação de Futebol de Lisboa e onde consta que o Grupo Dramático e Sportivo de Cascais era o filiado nº 129 daquela agremiação.

Além de comprar a gravura, senti-me desde logo tentado a recordar os anos de ouro do Desporto-Rei no nosso clube e, para isso, socorri-me dessa obra notável da bibliografia desportiva que se intitula “Grupo Dramático e Sportivo de Cascais – 92 anos de Arte, Sport e Bem”, cujos autores (Manuel Eugénio Fernandes da Silva e José Ricardo Fialho) são dois amigos que muito estimo e admiro pelos seus dotes pessoais e pela dedicação à causa cascaense.

Uma história que começa em 1915

Logo no ano da sua fundação, o Dramático ligou-se à prática do futebol, abrindo a 4 de Julho de 1915 inscrições para a prática deste desporto e apresentando no dia 29 de Agosto, no seu primeiro campo, na Av. Emídio Navarro, uma equipa de Futebol de 11, numa cerimónia a que se seguiu um jogo amigável contra a equipa do Ateneu Comercial de Lisboa.

A 6 de Janeiro de 1916 está documentada a realização de novo encontro, este contra uma equipa afamada da região de Lisboa, a do Sport Bom Sucesso. Infelizmente, no mês de Fevereiro o clube viu-se privado daquele que vinha sendo o seu campo de jogos, uma vez que o proprietário do terreno decidiu passar a realizar ali trabalhos de lavoura.

A paixão pelo Desporto-Rei era grande, e, a 12 de Junho desse mesmo ano, a direcção do Dramático dava conhecimento à Câmara Municipal de Cascais do início de obras de construção de novas instalações no sítio do Alto dos Lombos (hoje Pampilheira), enquanto a equipa ia jogando em campos cedidos por outras entidades e chegando a defrontar aquela que era uma das mais fortes equipas da região de Lisboa, o Sport Clube de Carcavelos, que está ligado à História da implantação do Futebol em Portugal graças ao “reforço” de numerosos trabalhadores ingleses da empresa do cabo submarino. Nesse jogo, registou-se um lisonjeiro empate a dois golos. Convém lembrar que, entre os súbditos de Sua Majestade, a prática do futebol estava já muito difundida.

A primeira visita do Benfica

Em Maio de 1922 deu-se a inauguração oficial do novo campo de futebol do Dramático, a que foi dado o nome de Guilherme Salgado, na estrada da Guia, e, nesse âmbito, o Sport Lisboa e Benfica trouxe a Cascais a sua primeira equipa. Foi um acontecimento! Segundo os autores do livro que temos vindo a seguir, “os jogadores lisboetas chegaram a Cascais pelas 10 horas, realizou-se depois um almoço oferecido pela Direcção e, em seguida, um passeio, e, pelas 17 horas, teve lugar o desafio, com a vitória do Benfica por 5-2”.

Avançando no tempo, damos conta de um jogo importante em 25 de Novembro de 1923, contra uma equipa do Oeiras, que era o campeão ainda não oficial da Linha de Cascais dessa época, mas que, apesar disso, foi derrotada pelo Dramático por 3-1.

A criação da Liga de Football Oeiras-Cascais e a “vez” de O Sporting nos visitar

A 24 de Maio de 1925 o campo Guilherme Salgado (caracterizado pelo desnível do terreno, que, na época, era característica de muitos dos espaços onde as equipas jogavam) recebeu as equipas de 1ª categoria do Dramático e do Clube de Futebol “Os Belenenses”, e a 4 de Novembro dá-se um acontecimento histórico. A criação oficial da Liga de Football Oeiras-Cascais, com regulamentos aprovados pela Associação de Futebol de Lisboa, em que se inscreveram os principais clubes (12) de Cascais, Estoril, Paço d’Arcos e Algés, representados com 1ª, 2ª e 3ª categorias.

Precedendo a primeira participação no campeonato desta Liga, o Dramático recebeu outra equipa muito forte naqueles tempos: o Casa Pia Atlético Clube.

Menos de um ano depois, em Março de 1926, o Dramático já ganhava títulos: a 3ª categoria tornou-se campeã da referida Liga. Em 1ª categoria, conseguiu o 3º lugar. No campeonato seguinte, iniciado a 31 de Outubro, a 1ª categoria começou com uma vitória por 8-0 frente ao Grupo Sportivo da Sociedade Estoril, antecessor do Estoril-Praia.

Novo salto no tempo, para registar outra grande efeméride do Desporto-Rei em Cascais. O Sporting Clube de Portugal deslocou uma equipa à vila para defrontar a equipa de honra do Dramático, com o desfecho final de 4-3 a favor dos “leões”.

A 13 de Maio de 1928, num encontro entre equipas de 1ª categoria por ocasião do 13º aniversário do nosso clube, recebemos o União de Lisboa, importante clube de Alcântara que foi objecto de fusão com o Carcavelinhos em 1948, para dar origem ao Atlético Clube de Portugal, e em que este não conseguiu melhor que um empate a 2-2.

De novo o Sporting, e também “Os Belenenses”

Em 1931, ainda no campo Guilherme Salgado, o Dramático recebeu um “team” misto do Sporting Clube de Portugal e resistiu galhardamente, registando-se no final nova vitória dos “leões” por apenas 4-3.

Passados três anos, a 13 de Maio de 1934, de novo integrado nos festejos do aniversário do nosso clube, tivemos a “visita” do Clube de Futebol “Os Belenenses”, e conseguimos averbar uma vitória por 3-1.

Em 1936 fomos novamente os vencedores do campeonato da Liga de Cascais-Oeiras. Os jornais da região de 31 de Maio noticiaram que “ reinou grande entusiasmo nesta vila pela vitória alcançada pelo GDSC, sendo servido aos jogadores, direcção e demais convidados, na Pastelaria Tavares, uma taça de champanhe, que serviu de pretexto para brindar o Dramático. À noite, realizou-se um grandioso baile de homenagem aos campeões.”

Grandeza e declínio do futebol no Dramático com o eclodir da II Guerra Mundial

E, a 28 de Junho desse ano, a nossa equipa de 1ª categoria voltou a receber, e “bater” por 3-1, o Sporting Clube de Portugal, que acabava de se sagrar campeão da II Divisão de Lisboa.

Começávamos a tomar o gosto às faixas de campeão, e em 1937 conseguimos o primeiro lugar em 1ª e 2ª categorias, “batendo” na última jornada  o Carcavelos por 4-1 e 5-0, respectivamente.

A 14 de Abril de 1940, já se combatia na II Guerra Mundial, a equipa principal do Benfica, na qual pontificava e era capitão o grande jogador que foi Guilherme do Espírito Santo, visitou mais uma vez a nossa vila para disputar com o Dramático a Taça Sá e Oliveira.

É de 5 de Fevereiro de 1941 o último registo da vitória da equipa de honra dos “nossos” no campeonato da 3ª Divisão – Liga Cascais-Oeiras (como se passou a designar) da Associação de Futebol de Lisboa, à compita com o Estoril Praia, Paço d’Arcos, Bom Sucesso, Parede, Carcavelos e Oeiras.

Em 1942 iniciou-se um longo declínio do Desporto-Rei no Grupo Dramático e Sportivo de Cascais. Não deixa de ser sintomático que aquilo que se tornou regra a favor dos chamados “grandes” se tenha verificado nesse ano: a transferência de um dos nossos melhores jogadores, Vasco Oliveira, para o Clube de Futebol “Os Belenenses”, pela quantia de 12.000 escudos.

*NELSON FERNANDES recorda em Cascais24Horas duas vezes por semana factos e curiosidades que marcaram outrora Cascais e fazem parte da história de esta vila de reis e pescadores.